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Disparada dos preços ressuscita velhos hábitos da inflação
   
     
 


27/03/2011

Disparada dos preços ressuscita velhos hábitos da inflação
Brasileiros religam o freezer para estocar alimentos e enchem as despensas
 
"Quando se vive com inflação alta, o dinheiro não vale nada. O negócio é gastar o mais rápido possível porque o salário vira pó muito rápido" Leonardo Giordano, aposentado

Depois de seis planos econômicos fracassados, a partir de 1994, com o nascimento do Plano Real, finalmente os brasileiros puderam aposentar o uso das despensas e de freezeres e, melhor, garantir o tão sonhado poder de compra. A temida hiperinflação, que, um ano antes, deixara uma alta de 2.477% no custo de vida, começava a ser coisa do passado. Em 2011, quando a estabilização da economia completa 17 anos, o trauma que parecia vencido voltou a perturbar os brasileiros. Uma geração inteira de filhos da inflação anda assustada com a remarcação exagerada de preços nos supermercados, a ponto de ressuscitar velhos hábitos, como o de estocar mercadorias. No comércio, o mais execrado dos símbolos do longo período de descontrole inflacionário, a maquininha de etiquetar produtos, voltou a dar as caras. Restaurantes já não se intimidam em, diariamente, rasurar os cardápios, sempre cobrando a mais por bebidas e pela comida.

Ainda que não queira fazer alarde, a equipe econômica do governo Dilma Rousseff entrou em estado de alerta. Mais do que lidar com as desconfianças do mercado financeiro, que vem jogando as estimativas de inflação para cima, o que realmente está demandando as atenções é o comportamento da população diante da carestia. A apreensão no Palácio do Planalto pode ser traduzida por um importante assessor da presidente. Diz ele: “Quando nos dirigimos aos analistas e afirmamos que as medidas tomadas pelo governo, como a alta da taxa de juros (Selic) e a restrição ao crédito, terão efeitos daqui a seis meses, mesmo resistentes, eles entendem o que estamos dizendo. Quando, porém, pedimos às pessoas que tenham paciência, apesar de os preços dos alimentos terem subido mais de 60% desde julho do ano passado, de nada adianta. O quilo da carne, cujo valor dobrou em menos de um ano, fala mais alto”.

O aposentado Leonardo Giordano, 63 anos, que o diga. As últimas idas ao supermercado fizeram com que ele voltasse ao passado. Contrariado com a constante alta dos preços, religou o antigo freezer, comprado para estocar carne no fim dos anos 1980, quando a inflação chegava a 40% em um único mês. “Infelizmente, tive de fazer isso para congelar os preços”, lamenta. Ele conta que, a cada vez que sai de casa para fazer as compras mensais, está voltando com menos produtos. “Há algo de muito errado no ar. Depois de muitos anos, estou vendo o fantasma da inflação de volta”, diz. Não sem motivos. Segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15) de março, prévia do indicador oficial do mês, o tomate ficou 17,57% mais caro e a batata-inglesa, 9,66%. O quilo da picanha já é vendido a R$ 60.

Pessimismo
O processo de remarcação está tão intenso que 83% dos entrevistados pelo Instituto Datafolha dizem que a inflação continuará alta ou poderá aumentar mais. Tal percepção se repete no mercado. Já há analistas falando em índices superiores a 7% neste ano, nível sem precedentes desde 2005. O governo atribui esse salto às commodities (mercadorias com cotação internacional), sobretudo as agrícolas, afetadas por contratempos climáticos. E garante que os preços desses produtos vão cair nos próximos meses. Entre os especialistas, contudo, o atual processo inflacionário carrega uma série de motivos: além das commodities e de fatores positivos como a melhoria do mercado de trabalho, há a gastança dos últimos dois anos do governo Lula para ajudar a eleger Dilma.

Para Maristella Ansanelli, economista-chefe do Banco Fibra, na melhor da hipóteses, a inflação deste ano ficará no teto da meta definida pelo governo, de 6,5%. “Pesam nessa estimativa tanto os dados de inflação piores do que o esperado quanto os dados de atividade econômica, que mostram um crescimento ainda bastante robusto”, justifica. Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú Unibanco, não tem dúvidas de que o quadro inflacionário voltou a se deteriorar e, por isso, revisou a sua projeção do IPCA de 2011 de 5,8% para 6,3%. “Os fundamentos indicam inflação acima do centro da meta (definida pelo governo, de 4,5%), mesmo na ausência de pressões das commodities”, diz.

O próprio presidente do BC, Alexandre Tombini, admite que, entre junho e julho próximos, a inflação acumulada em 12 meses ficará acima de 6,5%. “Ninguém consegue conviver com isso”, reclama, taxativo, o aposentado Giordano. “Quando se vive com inflação alta, o dinheiro não vale nada. O negócio é gastar o mais rápido possível porque o salário vira pó muito rápido”, ensina. Mas nem de longe ele quer seguir essa receita novamente.

Garantia de lucro
Produtos com mais de uma etiqueta podem ser facilmente encontrados no comércio, principalmente em pequenos estabelecimentos, nos quais o código de barras ainda não foi implantado. Nas grandes redes de supermercados, os reajustes são mais rápidos e feitos de forma mais discreta: basta trocar os preços estampados nas prateleiras e confirmá-los no computador. Quem come e bebe fora de casa encontra valores corrigidos à caneta sobre a tarifa original em etiquetas ou mesmo ao lado dos antigos números. “Se o supermercado reajusta as mercadoria, em bares e restaurantes acontece o mesmo. Se não for assim, não temos lucro”, diz um comerciante.

Donas de casa trocam produtos e mudam de marcas para não sancionar carestia

Segundo analistas, a corrida por formação de estoques pode ter efeito contrário e estimular altas maiores das mercadorias. Momento exige cautela

Muita gente imaginava que as remarcadoras de preços tinham desaparecido. Mas elas estão nos supermercados (Breno Fortes/CB/D.A Press)  
Muita gente imaginava que as remarcadoras de preços tinham desaparecido. Mas elas estão nos supermercados

A nova geração não tem recordações da monstruosa inflação que assolava a economia do país nos anos 1980 e 1990. Naquela época, o descontrole dos preços levava a uma corrida por produtos que, no dia seguinte, valeriam ouro. Ainda que o país esteja longe de ser engolido pela velha inimiga, a comerciante Maria Zélia da Silva, 61 anos, já mudou os hábitos de consumo. “Se está muito caro, eu não compro. Isso vale para a carne, para o feijão, para o leite. Temos de nos rebelar, trocar produtos, mudar de marcas”, aconselha. Sempre que tem oportunidade e encontra o que está procurando em oferta, Zélia arremata em grande quantidade e estoca. “Pode não ser a melhor opção. Mas é uma forma de se prevenir da disparada dos preços”, acrescenta.

Apesar da sabedoria das donas de casa na administração do orçamento doméstico, os especialistas dizem que estocar produtos, principalmente alimentos, é um exagero. Haroldo Mota, professor de finanças da Fundação Dom Cabral, lembra que o Brasil de hoje é completamente diferente do de 25 anos atrás. Ele reconhece que há, atualmente, um movimento de alta de preços, mas que começa a ser contido por ações do Banco Central, como a alta da taxa básica de juros (Selic) e medidas prudenciais para conter o crédito.

“Depois da estabilização da moeda, o avanço da inflação que observamos hoje não justifica a antecipação de consumo”, afirma Mota. “Sendo assim, fazer estoques é desnecessário e pouco eficiente. Por duas razões. A principal é de ordem macroeconômica. Quando se antecipa o consumo, a demanda aumenta, os preços se aceleram e todos perdem”, diz. “A segunda é que a eventual economia de antecipação e de formação de estoque pode ser enganosa, pois, comprando mais, pode-se acabar consumindo mais”.

Bolso apertado

Fábio Romão, analista da LCA Consultoria, explica que o mais saudável para o bolso, hoje, é não estocar ou antecipar consumo. No seu entender, os preços podem subir em determinado momento mas, dependendo do cenário, podem voltar a baixar. “O quadro atual é diferente do verificado nos anos 1980 e 1990”, garante. Mas ele admite que já é comum encontrar casas com despensas e freezeres. Também está se tornando rotina vizinhos se juntarem para ir aos atacadões e comprarem em grandes quantidades para obter descontos. São esses mesmos consumidores que, nos mercados, se digladiam quando para tirar proveito da promoções relâmpagos.

“Medidas estão sendo tomadas para frear a alta de preços. Os efeitos da elevação da Selic (que passou de 10,75% para 11,75% em 2011) são defasados. Demoram de seis a nove meses para mostrar os impactos sobre a atividade e os preços”, argumenta Romão. Ele destaca ainda que o Banco Central adotou medidas prudenciais que deixaram o crédito mais caro e os prazos de pagamento, mais curtos. Além disso, os bancos tiveram de recolher compulsoriamente, desde dezembro do ano passado, mais de R$ 90 bilhões aos cofres da autoridade monetária. “Tudo isso ajudará a conter o consumo e a reverter a onda de remarcações dos preços. É questão de tempo.”

A despeito do que já foi feito, os analistas reconhecem que o BC terá de promover pelo menos mais uma alta dos juros e a baixar mais restrições ao crédito. Com isso, o nível da atividade econômica, que pressiona, sobretudo, os preços dos serviços (cabeleireiro, mecânico, chaveiro, entre outros), deverá arrefecer, com o ritmo de expansão acomodando-se em torno de 4%.Uma desaceleração para esse patamar (no ano passado, o PIB deu um salto de 7,5%), na teoria, deve colocar o país de novo em uma rota de inflação mais cômoda para os consumidores.
 

Nos restaurantes, os cardápios estão rasurados, mostrando que os aumentos constantes estão se tornando rotina (Breno Fortes/CB/D.A Press)  
Nos restaurantes, os cardápios estão rasurados, mostrando que os aumentos constantes estão se tornando rotina

Promessa deve ser cumprida
 

O economista Aurélio Bicalho, do Itaú Unibanco, diz que, com a atividade esfriando, o mercado de trabalho também se acomodará e o aumento da renda não deixará de ser um impulsionador do consumo, ajudando no combate à inflação. Ele ressalta, porém, que o governo terá de fazer a sua parte, ao cumprir, na íntegra, a promessa de cortar R$ 50 bilhões do Orçamento deste ano. O peso do Estado na economia brasileira ainda é muito grande. Se estimular demais a demanda pode minar todo o esforço que vem sendo feito pelo Banco Central para levar a inflação ao centro da meta, de 4,5%, até o início de 2011.

Fonte: Correio Braziliense
Autor: Victor Martins
Revisão e edição: de responsabilidade da fonte

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